quinta-feira, 10 de julho de 2014

7: O anti-futebol pelo anti-jornalismo ou movimentação e Gramsci


1."A Alemanha jogo algo parecido como futebol, mas é sempre perigoso, às vezes dá certo", essa análise profunda, repetida a exaustão por Galvão, era a principal referência global sobre o futebol alemão até pouco tempo atrás, tanto nas transmissões ao vivo quanto nos programas anti-jornalísticos, baseadas em piadinhas babacas e patriotadas patéticas. Óbvio que nem Globo nem Galvão fizeram, ou farão, um mea-culpa( talvez daqui há 50 anos). A distância entre a percepção da Globo e a realidade pode ser comprovada pelos jogos do campeonato alemão, pelo federação ser pública e não-privada, pela participação da torcida, pela divisão justa das receitas televisivas, pela prisão dos cartolas bandidos, e agora por esse 7 x 1 eterno. A Alemanha constituí para o consórcio CBF-Globo, um exemplo a ser escondida, um modelo a não ser seguido, o "anti-futebol" brasileiro por definição.

2. CBF-Globo são orgulhosamente arcaicos, por isso a justa escolha de dois defensores do atraso taticamente e tecnicamente, Felipão e Parreira estão em uma má fase que dura 10 anos. Recompensa-se os fracassos destes com uma fé mística conservadora: melhor o passado provável que um futuro possível. Os grandes, e pequenos, treinadores do mundo estudam, leem, analisam jogos pelo mundo, pensam o futebol. Scolari e Parreira formam "famílias", nas quais os jogadores infantilizados não ouvem instruções táticas mas recebem um abraço caloroso. A tática é entrar com a mão no ombro do coleguinha. Uma graça de fracasso.

3. O moderno no futebol brasileiro nada tem de novo, é a fórmula histórica da nação: retire-se os pobres, elitize, embranqueça sua alma. A imprensa pacheca apoia essa ignorância sobre o jogo e essa modernização conservadora atroz, que transformou os estádios em arenas-playgrounds para os ricos construídas com dinheiro público.Alberto Dines resume: "A nação-criança tem uma imprensa-criança que adora celebrar e não pensa no dever de casa". Nesse caso, a imprensa-criança faz bullying, rouba o lanche e ainda dedura a coleguinha para a professora.

4. Agora, os sócios do consórcio CBF-Globo, em seus vários veículos, começam o movimento de atenuar o massacre retumbante, com "perder é do jogo" ou "foi a Alemanha que jogou como nunca", ou ainda "foram aqueles 5 minutos". Verdades para amenizar o que deve ser escancarado: a arrogância cínica que coloca o Brasil no sentido contrário do futebol mundial. Ofende a entrevista coletiva feita pelos comissionários do atraso, arautos do scolarismo, sem nenhuma vergonha, sem pedir desculpas ao povo. Parreira leu uma "carta da dona Lúcia" repleta de elogios a eles mesmos. A comissão técnica curtiu o próprio post no facebook. Qualquer jornalista que se preze, ou respeita a inteligência daqueles a quem transmite a mensagem, teria indagado com veemência tal gesto ridículo. Só que, aparentemente, não havia nenhum desse tipo cerebral na coletiva, apenas globais e seus ascetas. O anti-jornalismo salvando o anti-futebol.

5.A Itália campeã em 2006 obteve uma vitória exclusivamente tática com um meio-campo superpovoado, ocupando todos os espaços do campo de defesa, entretanto com movimentação constante e objetiva. A Espanha de 2010, bastante baseada no Barcelona 05-08, reduziu a objetividade, acentuando a movimentação com a posse de bola, ocupando mais o campo de ataque. Esse é o paradigma do futebol na atualidade: ocupação de espaço pela posse de bola ou como movimentar-se o melhor possível. Nada de baboseiras sentimentalóides, mas ocupação tática dos espaços fundamentais.

6. Do cárcere italiano, Gramsci não podia se movimentar muito, mas já sabia a importância da ocupação de espaços. A estratégia da "guerra de posições" reside numa ocupação progressiva de espaços no imaginário da sociedade civil, visando romper a hegemonia cultural das classes dominantes. Esse imaginário seria composto por instituições como escola, igrejas e os meios de comunicação. No início do século XX, época que viver Gramsci, os trabalhadores expropriaram o futebol, tornando um jogo da massa para as massas, politizando. O proletário britânico que espalhou vitoriosamente o futebol pelo mundo, não os lords. Multinacionais como FIFA e CBF apenas exploram esse legado, nada inventaram, nada estimularam, pelo contrário. A cada ano o Brasil perde jogadores (trabalhadores) que não se reconhecem no povo e na torcida, por sua vez os torcedores não se identificam com os jogadores e são expulsos das famigeradas arenas, tomadas agora por clientes. A sobrevivência do futebol passa pelo retorno da popularização efetiva.

7. Uma organização popular pode, e deve, aproveitar o momento e unir o bloco dos descontentes e envergonhados para revolucionar o futebol e assim poder reformar a própria imprensa. Uma chance histórica: tirar o jogo de cartolas ligado a interesses econômicos nefastos, para romper o monopólio da cobertura global jornalística. Enfraquecer a elite que detém a exclusividade sobre o jogo é fortalecer não só o futebol, como a mídia alternativa e independente. Assim, permitindo novas formas de se ver e ouvir para além do próprio futebol, rompendo a hegemonia conservadora que controla tanto o futebol como a mídia, representada pelo consórcio Globo-CBF.

7x1. Um narrador alemão, sorrindo, poderia dizer em uma transmissão: "o Brasil tem algo parecido com jornalismo, é sempre perigoso, mas nunca deu certo."

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